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quarta-feira, 14 de março de 2012

O impacto do estágio

Por Ruy Martins Altenfelder Silva
Estagiários não são 'escraviários': 64% acabam efetivados; o alto desemprego entre jovens e a bolsa-auxílio fazem do estágio uma grande oportunidade.
O jovem Edmilson Guimarães Nascimento conseguiu realizar um sonho que ninguém de sua família havia atingido. Venceu o vestibular para a Universidade Federal do Maranhão, localizada na cidade de Imperatriz, a 12 quilômetros do município de João Lisboa, onde vivia. Com a ajuda dos avós - que já sustentavam sua mãe e seus três irmãos com um pequeno roçado-, tinha o dinheiro do ônibus. Precisava ainda cobrir parte da distância de bicicleta e mais um quilômetro a pé, tanto na ida quanto na volta da faculdade. Assim mesmo, até o quarto semestre, ele conta que capinava terrenos para completar o custo do transporte. Chegou a pensar em desistir de tudo para trabalhar em uma fazenda no Mato Grosso. Sua história mudou quando foi aprovado para um estágio em uma empresa em Imperatriz, recebendo a bolsa-auxílio obrigatória, que até ajudou no orçamento familiar. Em um ano, assumiu as tarefas de um superior que mudou de emprego, foi efetivado como celetista e saiu para abrir o seu próprio negócio, um escritório de contabilidade em sociedade com um colega que conheceu no estágio.
Hoje, casado e com três filhos, planeja trazer sua mãe para morar em Imperatriz. Qual o crédito do estágio nesse case de sucesso? "Afinal, 70% de tudo que aprendi na minha profissão foi como estagiário." A história de Edmilson, disponível em http://www.ciee.org.br/, não é a única que comprova o valor do estágio como uma eficaz modalidade de qualificação de futuros profissionais, ao completar o aprendizado teórico com a indispensável experiência prática exigida pelo mercado de trabalho. Histórias similares se multiplicam aos milhares há quase meio século. Uma pesquisa do instituto TNS InterScience comprova o peso do estágio no acesso a um primeiro emprego formal: 64% dos estudantes são efetivados ao final do primeiro ou segundo período de estágio.
Esse número ganha mais expressão ainda se comparado à taxa de desemprego jovem levantada pelo IBGE: enquanto a média nacional de desemprego beira os 6%, o índice chega a 12,6% na faixa etária dos 20 aos 24 anos - e é ainda maior no segmento dos 15 aos 17 anos, com 22,9%. Assim, a análise dos benefícios do estágio para a formação de novos talentos não pode partir de uma visão apenas laboral, até porque um jovem inexperiente não poderia ser avaliado como um profissional formado. Tal análise deve levar em conta que o estágio é uma atividade pedagógica, reconhecida e disciplinada por lei, que define os direitos e os deveres do estagiário. E, nessa condição, tem efeitos pedagógicos (está alinhado ao currículo escolar) e de desenvolvimento de habilidades pessoais e profissionais requeridas pelo mercado de trabalho, tais como disciplina, espírito de equipe, aprendizado contínuo etc.
Por tudo isso, constitui uma fonte de recrutamento muito utilizada por empresas de todos os portes e segmentos. Pois, como diz José Pastore, reconhecido especialista em relações de trabalho: "As organizações observam bem esse futuro profissional, analisam seu talento e sua competência, investindo, na medida do possível, em seu treinamento para acabar integrando essa pessoa no quadro definitivo. Esse é o indicador muito forte da eficiência do estágio." Um detalhe que desmente a ideia do chamado "escraviário": a média da bolsa-auxílio concedida a estagiários de nível superior no Maranhão é de R$ 494, enquanto a renda per capita em João Lisboa, onde Edmilson capinava terrenos para pagar o transporte até a faculdade, é de R$ 346 - números que falam por si sobre o impacto social do estágio nas condições de vida de estudantes, em especial os que vivem em regiões de menor renda.
Fonte: Folha de São Paulo